A EUROPA E OS PORTUGUESES
35 ANOS DA ADESÃO DE PORTUGAL À UNIÃO EUROPEIA




Beatriz Meireles, Mariana Fernandes e Marta Lima

A UNIÃO EUROPEIA COMO IMPULSIONADORA DAS PME'S PORTUGUESAS

Com apenas 15 anos, Albano Fernandes recorda as imagens de Mário Soares, no dia 12 de junho de 1985, dia que marcou o início das relações entre Portugal e a União Europeia. Com a assinatura do tratado de adesão à Comunidade Económica Europeia, Portugal tornou-se o 12º país a aderir ao projeto europeu. A 1 de janeiro de 1986, Portugal era oficialmente membro.

Este momento ficou marcado na história do país, como o início das relações externas de Portugal com os restantes estados-membros. Já lá vão 35 anos de cooperação económica, política, cultural e social. São extensas vantagens que a União Europeia oferece. Desde logo a possibilidade de circular livremente no espaço Schengen, um "espaço sem fronteiras internas no interior do qual os cidadãos europeus e muitos nacionais de países que não pertencem à UE podem circular livremente, em turismo ou por motivos de trabalho, sem serem sujeitos a controlos fronteiriços." Outra vantagem de pertencer ao projeto europeu é a acessibilidade no que toca à moeda. O euro é a moeda oficial de 19 dos 27 estados-membros. Estes países consitutem a chamada zona euro. A existência do projeto europeu, permite às empresas nacionais expandirem os seus horizontes nos mercados europeus, potencializando ainda mais os seus produtos num mercado cada vez mais competitivo.

Licenciado em Engenharia de Produção pela Universidade do Minho, Albano Fernandes sempre ambicionou ter o seu próprio negócio. No entanto, foram as experiências anteriores nos setores moveleiro e do calçado que o incentivaram a pôr em prática o espírito empreendedor. Concebeu a empresa, em 1999, com o nome de Albano Miguel Fernandes Unipessoal, Lda. Sem qualquer fundos de maneio, ergueu a empresa sozinho. “O que faturava (naquele) mês era o que tinha para pagar o salário das pessoas.” De 1999 a 2005, Albano Fernandes trabalhava a feitio para as empresas do setor da área do calçado, ou seja, fazia todo o trabalho de outsourcing, ao mesmo tempo que trabalhava com os excedentes das outras fábricas, nunca tendo coleções próprias. “Comecei a perceber que teria que fazer outras coisas. No meio deste processo, comecei também a desenvolver coleções de sapatos de crianças para uma marca de roupa francesa, e vendia para todo o mundo.”

Devido a imitações de sapatos de que a empresa foi sendo alvo, Albano Fernandes decidiu renovar a imagem da empresa com um rebuilding da marca. “Muitos clientes que não compravam 2w4 começaram a comprar ToWorkFor, só pelo facto de termos toda a comunicação bem assente. A juntar a isso, foi obrigatório os sapatos serem bonitos, confortáveis , terem alguma tecnologia dentro dos sapatos, as pessoas copiam os nossos sapatos, mas os nossos têm mais isto, têm mais tecnologia associada. E isto permite selecionar os melhores clientes. O facto de venderes a melhor tecnologia, os melhores produtos, os bons clientes querem estar contigo. Esta diferenciação tem-nos permitido crescer muito”. 90%  do volume de negócios da AMF Safety Shoes acontece na Europa. “Todos os sapatos que nós vendemos são certificados, é uma certificação europeia, e por natureza é-nos mais fácil vender na Europa. Este ano nos primeiros quatro meses já crescemos 25% e portanto não tem sido necessário ir para outros mercados”.

O que distingue a AMF Safety Shoes das demais empresas de calçado de segurança é, certamente, o investimento na tecnologia, conseguindo assim dar um boost ao calçado técnico.


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No entanto, não só de dinheiros próprios se construiu este negócio. A AMF Safety Shoes já beneficiou de fundos europeus, que ajudaram a mitigar riscos da empresa. A empresa foi beneficiária do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), um fundo que representa 42,54% do orçamento da União Europeia para Portugal no período de 2014-2020.

Para Albano Fernandes, o processo de candidatura aos fundos europeus é acessível. “Nós temos um processo muito ágil, muito bem preparado, porque temos uma empresa que nos ajuda bastante. A APICCAPS (Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e seus Sucedâneos), que é a associação de industriais do calçado, juntamente com o centro tecnológico do calçado, têm mecanismos muito ágeis, têm técnicos muito bem preparados que nos ajudam a fazer as candidaturas. Todas as candidaturas são feitas via Centro Tecnológico do Calçado. De alguma forma, diria que as coisas funcionam bem. O que nem sempre é interessante é o timing de abertura das candidaturas, por norma é um timing curto e muitas vezes se nós não estamos muito atentos pode haver um novo projeto e nós não sabemos, porque não estamos atentos e não temos tempo de preparar a candidatura ou não a preparamos da melhor forma”.


Também Eduardo Freitas gere uma PME's co-financiada por fundos europeus. A LUIPEX é uma empresa sazonal de swimwear, sediada em Guimarães, que produz para homem, mulher e criança.

As PME’s representam, desde 2004, 99% do total das empresas em Portugal. Isto representa uma grande competitividade entre elas, que se traduz num investimento por parte do Portugal 2020 para esta parcela. “Há 4.6 mil milhões de euros só para as tornar mais competitivas”, indica um artigo do Expresso.

O Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro, estipula o seguinte.

“A categoria das micro, pequenas e médias empresas (PME) é constituída por empresas que empregam menos de 250 pessoas e cujo volume de negócios anual não excede 50 milhões de euros ou cujo balanço total anual não excede 43 milhões de euros.”

De acordo com a notícia do Expresso, Portugal é o país da Europa que mais aposta nas PME’s. “Um quinto dos fundos do Portugal 2020 vai diretamente para as micro, pequenas e médias empresas”.

Segundo Eduardo Freitas, Portugal é um país cuja “génese está assente em micro, pequenas e médias empresas”.

Segundo dados da PORDATA, os números das PME’s não têm sido constantes em Portugal. Dos dados disponíveis no site, é possível perceber que a partir de 2004 as PME’s começaram a ganhar dimensão na economia portuguesa, lançando-se a todo gás até 2008, ano em que atingiu um grande pico em termos de número de PME’s em Portugal, estando registadas 1.260.302 micro, pequenas e médias empresas em Portugal. A partir desse ano, assistiu-se a um decréscimo do número de PME’s. 2021 foi o ano em que menos PME’s foram contabilizadas, somando um número de 1.085.894. No entanto, a partir desse ano a subida do número de PME’s em Portugal foi exponencial, registando sempre um aumento contínuo ao longo dos anos. Em 2019, último ano com registo na PORDATA, o total de PME’s em Portugal totaliza um número de 1.333.649.


Empresário há 32 anos, Eduardo Freitas iniciou a sua carreira profissional nesta área há 14 anos. Trabalhou por conta de outrem até aos 27 anos, na Friolax, no que diz ser a maior empresa da área de swimwear em Portugal. No entanto, o desejo de Eduardo era abrir o seu próprio negócio e trabalhar por conta própria.

Eduardo Freitas confessa que a criação da LUIPEX não foi “um projeto que tenha surgido de uma ideia brilhante” da sua cabeça. Alimentado pelo tipo de confeção que era feita na outra empresa onde era trabalhador, Eduardo refere que a LUIPEX “foi uma coisa que foi projetada ao longo de alguns anos”. Na Friolax, Eduardo afirma que não só se confeccionava artigos de swimwear como também outro tipo de artigos, ligados ao vestuário exterior. A LUIPEX nasce assim como uma empresa de confeção de um produto sazonal, o swimwear.

Eduardo afirma que tanto os fornecedores como os clientes da empresa são, maioritariamente, membros do projeto europeu. Eduardo destaca a Itália, França e Espanha. “São estes três países que têm todo o know-how que é preciso para fornecer produtos com as características que toda a Europa precisa”. No que diz respeito aos clientes da empresa, os países com maior expressão são, de uma forma geral, “Espanha, França, Holanda, Bélgica, Alemanha, Suécia, Dinamarca (e) Suíça”. A empresa trabalha com marcas de referência como a Dior, a Balmain e a Bonpoint, em França, a Moschino e a Saint Barths, em Itália, e a Burberry, no Reino Unido.

No que diz respeito aos fundos europeus, Eduardo Freitas ressalta que a LUIPEX sempre se governou com dinheiros próprios, sendo a ajuda comunitária uma parte muito pequena de todo o investimento que já foi realizado na empresa.

Os fundos comunitários vindos de Bruxelas serviram para introduzir uma parcela na empresa relacionada com a sustentabilidade. Na LUIPEX, não há sustentabilidade sem a parte social. 

Apesar disso, o CEO da LUIPEX admite que o processo de candidatura aos fundos comunitários não são tão simples. "Todos os processos de apoio só chegam às pequenas empresas porque as grandes empresas têm que deixar alguma coisa para as PME’s para justificar aquilo que é o objetivo destes fundos comunitários. As pequenas empresas, para conseguir isso, têm de ter alguma independência face a esses fundos. Para termos esses apoios temos de dizer que também contribuímos para uma grande parte".


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Ainda dentro do ramo da sustentabilidade, a LUIPEX mostra uma preferência pelos processos eco-friendly tanto na confeção dos produtos como na manutenção da própria empresa e a pensar no bem-estar dos colaboradores.

“Eu posso ter os melhores produtos para proteger o planeta, mas eu só protejo o planeta se proteger as pessoas que comigo trabalham. Portanto sustentabilidade é isso tudo, um mix que permite às empresas depois (poderem) avançar naquilo que (são) as preocupações globais. O que nós fizemos aqui foi a instalação de painéis que produzem 45% da energia que consumimos e, ao mesmo tempo, ajudar a criar as melhores condições de trabalho para os colaboradores. Desde logo, procurar máquinas que diminuíssem o volume de ruído, máquinas que trouxessem outra qualidade de trabalho. Tudo isso contribui para a sustentabilidade”. 

Para Eduardo Freitas, “Portugal foi um dos grandes vencedores” da entrada na União Europeia. Não fosse a entrada de Portugal na UE há 35 anos, não podíamos falar de uma cooperação económica assente nos fundos comunitários europeus que são um grande alicerce e uma alanva aos crescimento e desenvolvimento de Portugal como país e nação.


UMA PORTA ABERTA PARA FINANCIAMENTO


Uma das grandes vantagens de Portugal ter aderido à União Europeia foi ter uma porta aberta para uma grande fonte de financiamento. Assim que prestamos mais atenção ao que nos rodeia, descobrimos que diariamente estamos em contacto com infraestruturas e produtos financiados pela União Europeia. Aliás, o eurodeputado José Manuel Fernandes informa que “em Portugal, cerca de 85% do investimento público tem origem no orçamento da UE”. Desde autoestradas e centros de saúde, à distribuição de material informático e ciclovias, são vários os exemplos de necessidades que têm vindo a ser colmatadas com essas verbas. Paulo Mourão, docente de Economia na Universidade do Minho, confirma que “muitas obras, sobretudo de caráter público, e mais volumosas em termos de gastos, não teriam sido feitas nos últimos anos se não houvesse um apoio como houve dos fundos europeus”.

Com a chegada da pandemia da Covid-19, em março de 2020, surgiu a necessidade de introdução de medidas de mitigação de curto e médio prazo, para o combate ao vírus, com vista à recuperação e à resiliência da economia e da sociedade portuguesa.

Desta forma, foi criado um instrumento comunitário estratégico de mitigação do impacto económico e social da crise, capaz de promover a convergência económica e a resiliência das economias da União, contribuindo assim para assegurar o crescimento sustentável a longo prazo, e para responder também aos desafios da dupla transição, para uma sociedade mais ecológica e digital. Foi neste contexto que o Conselho Europeu criou o Next Generation EU, um instrumento temporário de recuperação, a partir do qual se desenvolverá o Mecanismo de Recuperação e Resiliência, onde se inserem os Planos de Recuperação e Resiliência nacionais.

Em termos globais, este será o maior pacote de medidas de estímulo alguma vez financiado pelo orçamento da União Europeia, num total de 16.6 milhões de euros, para ajudar a reconstruir a Europa no pós-Covid-19, com o objetivo de criar uma Europa mais verde, digital e resiliente.

Portugal pode aceder a um envelope financeiro sem precedentes em períodos idênticos, que pode atingir os 50 mil milhões de euros em subvenções (a fundo perdido), em articulação com o Quadro Financeiro Plurianual. O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) português é de aplicação nacional, com um período de execução de 2021 até 2026, e vai implementar um conjunto de reformas e de investimentos que vão permitir ao país retomar o crescimento económico sustentado.

O Plano de Recuperação e Resiliência de Portugal assenta em três dimensões estruturantes.

A maior fatia do orçamento do PRR vai para a Resiliência, estando previsto um investimento de 11.125 milhões de euros. Devido à pandemia da Covid-19, todos os sistemas económicos ficaram abalados e fragilizados.

Cada dimensão prevê três roteiros que depois são estruturados e detalhados em componentes.

A dimensão da Resiliência prevê três roteiros.

Vulnerabilidades Sociais

Potencial Produtivo e Emprego

Competitividade e Coesão Territorial

A dimensão da Transição Climática prevê, também, três roteiros.

Mobilidade Sustentável

Descarbonização e Bioeconomia

Eficiência Energética e Renováveis.

A dimensão da Transição Digital tem prevista, igualmente, três roteiros

Escola Digital

Empresas 4.0

Administração Pública Digital

A chamada "Bazuca" é o plano de recuperação económica mais recente de Portugal, uma vez que surgiu numa situação urgente de pandemia.

Para empresas como a LUIPEX e a AMF, existe um envelope de 145 milhões das subvenções de Bruxelas para desenvolver uma bioindústria e produtos que substituam matérias-primas de origem fóssil por recursos biológicos em sectores considerados estratégicos. Este plano tem enfrentado críticas, tanto por parte das empresas, como por parte de alguns eurodeputados que não consideram este apoio suficiente. 

Eduardo Freitas defende que o dinheiro do Plano de Recuperação e Resiliência não deve ser distribuído com a mesma metodologia dos restantes fundos. “Quando o Estado traça planos para ficar com cerca de 70 ou 60% do valor desse plano para ele próprio injetar no mercado. Esse plano só resulta se o dinheiro chegar à mão das pessoas”.

Albano Fernandes partilha da mesma opinião do CEO da LUIPEX. Sendo a AMF Safety Shoes uma PME que já beneficiou de fundos europeus, o PRR vai ser uma nova oportunidade, contudo foi confrontada com um obstáculo.

"São projetos feitos para grandes volumes, para as grandes empresas, para as empresas públicas. Torna-se pouco ágil para as PMEs, mas também sei que haverá um 2030 (Portugal 2030) que irá colmatar de alguma forma a visão dos projetos individuais das empresas." A forma encontrada para contornar este obstáculo é uma “candidatura corporativa que pertence à direção da ANDICCAPS" (Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e seus Sucedâneos). Albano Fernandes

A associação ajuda as empresas destes setores, intervindo na sua internacionalização, contratação coletiva, formação e desenvolvimento. Desta forma, a AMF fica mais próxima de conseguir verbas do PRR. 

Os eurodeputados José Manuel Fernandes e Nuno Melo, ambos do Grupo Parlamentar do Partido Popular Europeu, mencionam a falta de uma parte deste envelope financeiro para as PME's privadas portuguesas, como é o caso da AMF e da LUIPEX. José Manuel Fernandes, do PSD, defende que “era essencial neste momento um instrumento de apoio à solvabilidade das pequenas e médias empresas, para a sua capitalização, e isso era essencial para preservar emprego, para nos dar resiliência para reforçar a nossa competitividade”. Por sua vez, Nuno Melo, do CDS-PP, acrescenta que o “desejável é que possa haver uma interação entre aquilo que é o setor privado e o setor público, para que não aconteça uma crítica que tem sido muito recorrente de todo este dinheiro estar muito vocacionado para a dimensão pública do Estado e menos para as micro, pequenas e médias empresas saídas de uma pandemia e vivendo muitas dificuldades”. Crítica feita também pelos CEO’s das duas PME's.

Contudo, os comentários acerca do Plano de Recuperação e Resiliência não terminam aqui. José Manuel Fernandes faz parte da Comissão dos Orçamentos e é um dos eurodeputados selecionados para escrutinar os planos apresentados pelos 27 Estados-Membros. O escrutínio dos planos passa, não só pela avaliação e revisão que é tida em conta pela Comissão Europeia, mas também pela sua monitorização. “Aquilo que eu tenho insistido é que depois de definirmos os objetivos que pretendíamos, devíamos articular, porque há complementaridades entre o Portugal 2030 e o PRR”. Desta forma, os dois iam funcionar em conjunto, evitando a sobreposição de projetos. 

Marisa Matias, vice-presidente do Grupo da Esquerda Unitária Europeia, aponta como falha a centralidade geográfica do plano, que no futuro impede um combate eficaz às alterações climáticas. “Se continuarmos a investir sistematicamente quase todos os recursos que vêm da UE nas regiões metropolitanas, o interior será mais deserto e terá menos recursos”. Como solução, Marisa Matias reitera que é preciso “um programa ferroviário nacional, repensar a agricultura, ter circuitos curtos de distribuição e apostar nas energias renováveis. Não é fazendo boas medidas numa parte do país e ignorando a outra que se combate as alterações climáticas”. 


Embora o Plano de Recuperação e Resiliência seja o apoio mais importante na história da União Europeia por ser o mais avultado, desde que Portugal aderiu, em 1986, que recebe apoios económicos de outros fundos europeus. Desde 2014 até 2020, o país esteve ao abrigo da Política de Coesão que se traduziu no Acordo de Parceria com a Comissão Europeia, mais conhecido como Portugal 2020. O programa reuniu a atuação dos cinco Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI):

Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER)

Fundo de Coesão (FC)

Fundo Social Europeu (FSE)

Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER)

Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e Pescas (FEAMP)

No total, segundo o website do Portugal 2020, Portugal recebeu 25 mil milhões de euros da União Europeia nesse período para investir na competitividade, inclusão e emprego, capital humano e sustentabilidade. 

Os cinco fundos do Portugal 2020 não foram os únicos que contribuíram. Além dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento, Portugal beneficiou ainda da Iniciativa de Emprego Jovem (IEJ). Segundo dados da Comissão Europeia, de entre o total de seis vias de montante, observa-se que os três que nos últimos seis anos apresentaram maiores taxas de execução em Portugal foram o FEDER, o FEADER e a IEJ.

No gráfico abaixo isto é observável através da pouca diferença de alturas entre as barras do “orçamento planeado” e “orçamento gasto”.

O FEDER é o fundo europeu que mais investiu em Portugal. Segundo a Comissão Europeia, “o FEDER tem por objetivo fortalecer a coesão económica e social na União Europeia colmatando os desequilíbrios entre as regiões” através de investimentos na competitividade das PME's, inovação e investigação, entre outros. No entanto, a distribuição da alocação no contexto português acaba por ser desigual, visto que 80% dos fundos devem concentrar-se nas regiões mais desenvolvidas. Segundo os dados da Comissão Europeia, Portugal recebeu do FEDER, entre 2014 e 2020, 9.978 mil milhões de euros. Nesse período, a zona onde mais se investiu foi na região Norte. Como se observa, em zonas como o Algarve e o Alentejo, que são menos industrializadas, não é investido tanto dinheiro como em outras zonas.

Por outro lado, uma das prioridades do PRR, a transição ambiental, não foi tida em conta pelo FEDER. Categorias como "Proteção Ambiental" e "Adaptação às Alterações Climáticas" surgem muito depois com quantias bastante menores, sendo que a área que recebeu mais investimento foi a Competitividade das PME’s.

Sem surpresas, o FEADER é o segundo fundo que mais contribui em Portugal. Por sua vez, “apoia a política europeia em matéria de desenvolvimento rural, através do financiamento de programas de desenvolvimento rural em todos os Estados-Membros e regiões da União”. Segundo a Comissão Europeia, Portugal recebeu 3.601 mil milhões de euros entre 2014 e 2020 do Fundo de Desenvolvimento Rural.

“A UE tem uma política agrícola, que é uma política agrícola de modernização mas também de produção em escala e efetivamente com essa produção em escala, aquilo que tem acontecido é que efetivamente alguns setores de algumas produções que eram mais minifundiárias, mais ligadas quase à venda em mercados locais, foram afetadas”. Paulo Mourão

Os agricultores portugueses deixaram de depender da agricultura, passando a praticar uma “agricultura desportiva”, que segundo o docente da UMinho trata-se do tratamento apenas ocasional das hortas ou dos pomares. Os dados da Comissão Europeia não dão informação sobre a distribuição do montante pelas zonas do país, apenas separando Portugal Continental dos arquipélagos.

Apesar de o professor Paulo Mourão mencionar a modernização, a principal área de investimento nos últimos seis anos foi a Adaptação às Alterações Climáticas e Prevenção de Risco.

A Iniciativa de Emprego Jovem nasceu em 2012 “para fornecer suporte para os jovens que vivem em regiões onde o desemprego dos jovens foi superior a 25%”, lê-se na Comissão Europeia. Funciona como um completo ao Fundo Social Europeu, e apoia exclusivamente os jovens que não estudam, não trabalham nem têm qualquer formação, garantido que têm acesso a estágios, colocações de trabalho e educação adicional levando a uma qualificação. No período entre 2014 e 2020, Portugal recebeu da IEJ 459 milhões de euros da União Europeia, 94% de execução relativa ao orçamento planeado de 543 milhões de euros. A IEJ apoia a implementação da Garantia para a Juventude. Ao abrigo deste apoio os Estados-Membros devem pôr em prática medidas para garantir que os jovens até aos 25 anos recebam uma oferta de emprego, educação continuada, aprendizagem ou estágio no prazo de 4 meses após deixarem a escola ou ficarem desempregados.


Terminado o período do Portugal 2020, inicia-se o novo orçamento da UE, o Quadro Financeiro Plurianual para 2021-2027, de onde vai surgir o Portugal 2030. O novo mecanismo de apoio a longo prazo apresentou um orçamento de 1.074.300 mil milhões de euros para todos os Estados-Membros. Os eurodeputados portugueses enumeraram algumas prioridades que devem ter sido em conta na hora de negociações.

Por um lado, Nuno Melo menciona a importância de uma melhor distribuição do dinheiro, pois o recebido da Política de Coesão anterior “foi gasto, mas não foi bem aproveitado”. Por outro lado, Marisa Matias não considera o apoio suficiente e questiona-se sobre as prioridades das áreas de investimento a que o dinheiro se destina. “No próximo quadro financeiro vai haver menos dinheiro para a coesão, vai haver menos dinheiro para a agricultura que também é problemático”, em vez disso, “vai haver mais dinheiro para a defesa e para as questões de segurança que do meu ponto de vista é algo negativo. A defesa nem sequer é um objetivo do tratado da União Europeia”.

Segundo o Governo Português, o panorama de ajuda económica para os próximos anos passa pela execução de fundos ainda do Portugal 2020, o Plano de Recuperação e Resiliência e por fim o Quadro Financeiro Plurianual a ser executado até 2029. Para operacionalizar o Portugal 2030 é necessário estabelecer um Acordo de Parceria com a Comissão Europeia, que só poderá ser formalizado após a aprovação dos regulamentos geral e específicos dos fundos, que pode ocorrer ainda no período da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia.

AS PRESIDÊNCIAS PORTUGUESAS

Sara Epifânio, membro da equipa de coordenação da Presidência Portuguesa, falou sobre o seu percurso até integrar a equipa de coordenação, os trabalhos que envolve a Presidência e o seu impacto.

“Confesso que até entrar para a faculdade não tinha a noção do que consistia a Presidência , mas a partir da altura em que entrei para a universidade que o bichinho da UE se intensificou mesmo muito”. Sara Epifânio

Sara Epifânio na sala principal do Edifício Europa, local onde decorrem os Conselhos Europeus

Sara Epifânio na sala principal do Edifício Europa, local onde decorrem os Conselhos Europeus

Antes da sua colaboração com a Presidência Portuguesa, a União Europeia era algo com o qual já se familiarizava. Tudo começou no primeiro ano de mestrado, quando Sara assistiu a uma conferência na Assembleia Nacional onde teve contacto com membros da direção geral dos Assuntos Europeus, que mostraram interesse em recrutar jovens para colaborar com a Presidência. “Ficou-me esse bichinho na cabeça e fiquei atenta se havia concursos, se havia iniciativas”, acrescenta. Quando soube do concurso para técnicos e assistentes técnicos para integrar a Presidência, Sara Epifânio candidatou-se e teve a “boa notícia” de que tinha conseguido um lugar como técnica superior na Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia.

Atual lugar de Portugal nas mesas de negociação

Atual lugar de Portugal nas mesas de negociação

Em junho de 2020, seis meses antes da Presidência, Sara Epifânio mudou-se para Bruxelas, onde começou a trabalhar junto de André Oliveira, coordenador da Presidência. O trabalho de Sara passava sobretudo por tratar de “toda a logística associada às reuniões e aos eventos que acontecem durante a Presidência aqui em Bruxelas”.


Esta é a quarta Presidência de Portugal no Conselho da União Europeia. As anteriores tiveram lugar em 1992, 2000 e 2007.


Na sua ótica, a Presidência é um marco especial para o país que a preside, sendo para Portugal “um dos pontos altos da nossa política para com a UE”. Porém, a fase da Presidência de um país é algo trabalhoso, sendo que atualmente foram elaboradas “mais de mil reuniões diariamente, imensos dossiers que estão nas nossas mãos [equipa da Presidência Portuguesa] e cabe a Portugal todos os grupos de trabalho e iniciativas que estão a acontecer”, revela Sara Epifânio. Segundo a integrante da equipa de coordenação da Presidência Portuguesa, o facto de vivermos uma pandemia faz com que exista “um esforço muito denso”, onde as várias iniciativas decorrem num sistema híbrido, como é o caso da maioria das reuniões, que decorrem por videoconferência.

Na visão de Sara Epifânio, a forma de trabalho da Presidência Portuguesa pode ser dividida em duas partes: uma que é liderada por Bruxelas e outra por Lisboa. Na perspetiva de Sara Epifânio, a atual Presidência “é muito baseada em Bruxelas e isto significa aquele trabalho que não se vê nos jornais”, explicando que, devido a essa questão, não são visíveis as “milhares de reuniões de grupos de trabalho, onde Portugal está a representar a posição dos 27 Estados-Membros, e o dia-a-dia de uma Presidência é baseada nestas várias reuniões, em contactos bilaterais, multilaterais com os vários parceiros, sejam os Estados-Membros, seja o Parlamento europeu, seja a Comissão”.

No que toca às funções da Presidência, Sara explica que, o que vinha a ser preparado há dois anos, teve que ser modificado devido à pandemia, obrigando, segundo Sara, a "alterar quase por completo" as prioridades e o modelo de ação da Presidência. No entanto, não se descurou dos principais meios de ação desta presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia, que se baseiam numa Europa com uma recuperação justa, verde e digital.


Os mandatos têm a duração de seis meses, sendo os mesmos feitos em trios. Por exemplo, atualmente Portugal encontra-se num trio com a Alemanha (que o antecedeu) e a Eslovénia (que o vai suceder).


Com base nos principais pilares, a Presidência Portuguesa investe numa Europa mais verde através das negociações para o Pacto Ecológico Europeu, assim como por intermédio da negociação da lei europeia pelo clima que, segundo Sara Epifânio tem “objetivos muito ambiciosos para uma Europa mais sustentável e verde”, de forma a que se reduzam as emissões de carbono em 50% até 2030, com a finalidade de que em 2050 a União Europeia se torne mais verde.

No que toca à transição digital, este pilar tem sido uma grande prioridade, para que, segundo a integrante da coordenação da Presidência Portuguesa, “aliada à recuperação económica, haja soluções tecnológicas a problemas tradicionais, sobretudo a alguns problemas que estamos a vivenciar com a pandemia”. Por fim, outra grande prioridade é uma Europa mais social. A Cimeira Social, que teve lugar no dia 7 de maio, foi o ponto alto da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia. Com esta Cimeira, pretendeu-se "reforçar o compromisso dos Estados-Membros, das instituições europeias, dos parceiros sociais e da sociedade civil com a implementação do Plano de Ação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais". De acordo com informações do site da Presidência Portuguesa "o Plano de Ação, apresentado pela Comissão Europeia em março, propõe um conjunto de iniciativas e estabelece três metas principais a atingir até 2030 ao nível europeu"

Taxa de emprego de pelo menos 78% na União Europeia

Pelo menos 60% dos adultos devem participar anualmente em formação

Redução do número de pessoas em risco de exclusão social ou de pobreza em pelo menos 15 milhões de pessoas, entre as quais 5 milhões de crianças

Com este evento de cariz europeu, Sara Epifânio espera ser possível “mitigar as consequências negativas que a pandemia tem tido nos cidadãos europeus”. 

José Manuel Fernandes, eurodeputado do Partido Social Democrata, revela que, no que toca à sua função, o que lhe compete fazer é ajudar a Presidência Portuguesa, uma vez que também se coloca na agenda tópicos que sejam relevantes para Portugal.

Nuno Melo, eurodeputado do CDS-PP , explica que existem prioridades transversais a qualquer Presidência, sendo estas as maiores prioridades da União Europeia, resultantes das suas circunstâncias. O eurodeputado exemplificou a sua premissa com a atual pandemia, revelando que “é evidente que qualquer presidência tinha que ser capaz agora de enfrentar as questões, os problemas da pandemia, dos planos de vacinação”. Também o Brexit é outra das questões com que, segundo Nuno Melo, a atual Presidência se tem que debruçar, visto que foi a saída de “um dos países mais ricos, mais dinâmicos, numa das maiores potência militares", sendo o Brexit a seu ver, "uma má notícia”.

No que toca às prioridades da Presidência Portuguesa, Nuno Melo aponta falhas na gestão da situação dos ataques em Moçambique, explicando que “o que seria normal era que Portugal, tendo a Presidência, através do seu Ministro dos Negócios Estrangeiros, nomeadamente, trouxesse a questão de Moçambique para o centro da política externa da UE. Portugal não tem sido uma voz deste mundo”.

Erros na pasta da agricultura foram igualmente apontados pelo eurodeputado, com o mesmo a revelar que "Portugal continua a desperdiçar muitos fundos comunitários”.

“De 1 a 20 daria uma nota 10 a este Governo, e daria porque não gostava que o meu país chumbasse, mas está longe de estar bem”.

Marisa Matias, eurodeputada do Bloco de Esquerda, revela que o facto de a Presidência Portuguesa ter escolhido o Pilar Social é algo de relevo. "Resta saber se dessa agenda social se vai conseguir retirar alguma mudança política para combater as desigualdades, ou se é mais uma declaração de intenções”, declara. Segundo a eurodeputada, não há um “superpoder” associado às Presidências, mas existe o poder de influenciar e direcionar a agenda “para questões que estão a ser subavaliadas", considerando por isso "importante" as questões sociais "estarem no centro da agenda".

“Ser português não faz grande diferença. As presidências rotativas são para servir toda a União Europeia”, aficomeça por explicar Marisa Matias. A mesma afirma que a única diferença é que são pedidas mais opiniões aos eurodeputados do país a assumir a presidência, devido ao facto de estes conhecerem melhor a realidade do Governo a presidir ao Conselho da União Europeia.

No que toca à pandemia da Covid-19, Marisa Matias aponta como consequências a desigualdade e a pobreza. Apesar da atual situação pandémica, a eurodeputada considera que “a Presidência Portuguesa teve um timing que creio que é positivo, pelo menos para o Governo procurar fazer algo”.

Contudo, existem pontos menos positivos que a eurodeputada aponta à atual Presidência, como é o caso da gestão das vacinas, onde “não há nenhuma pressão para libertar as patentes para aceitar a transferência tecnológica da produção da vacina para outros lugares do mundo”, estando a ser ignorados valores europeus e as necessidades de outros países. “Se resolvermos só na Europa, está longe de estar resolvido. A presidência portuguesa não tem estado à altura e isso é um grande problema”, acrescenta.

No que toca à gestão da Presidência Portuguesa na atual pandemia, Sandra Pereira, eurodeputada do Partido Comunista Português, defende que Portugal poderia ter feito “uma viagem de políticas” no tópico do emprego. Segundo a eurodeputada, seria relevante que houvesse um maior enfoque neste tema e na valorização social. A questão da vacinação é ainda um problema a corrigir , “a estratégia está a falhar”, explica. Na sua perspetiva, a vacinação é a principal arma para combater a Covid-19, mas aponta o dedo à Presidência Portuguesa, explicando que “Portugal, sendo presidente do Conselho da União Europeia, deveria de facto ter dado um sinal na diversificação da aquisição de vacinas, mas também no levantamento de patentes”. Para si, o grande problema que desencadeia toda esta situação está no domínio de interesses de multinacionais farmacêuticas ao qual a União Europeia é refém. “Não faz sentido que numa situação de crise pública haja umas quantas multinacionais farmacêuticas que não levantem as patentes para que as vacinas possam ser produzidas em mais sítios do mundo, cheguem a mais pessoas”, sublinha.  Segundo Sandra Pereira, os confinamentos e desconfinamentos só levam ao aumento de contágios, reafirmando assim a sua posição de defesa do levantamento de patentes e maior investimento nas vacinas, afirmando que “a vacinação é uma janela de esperança para a crise de saúde pública, mas também (para) começar a mitigar as consequências da Covid-19 nas nossas vidas”.

O CAMINHO DO PROJETO EUROPEU

Em 2021, o projeto da União Europeia encontra-se ameaçado por crises e pelo crescimento de extremismos políticos por todo o continente, incluindo Portugal. A partir daqui, começa a gerar-se alguma descrença no projeto europeu e nos seus princípios basilares. 

A necessidade de compreender melhor o que acontecia num país que se encontrava a atravessar uma crise migratória e que estava sob um regime extremista, levou Sara Epifânio a rumar a Budapeste através do programa Erasmus, no ano de 2017.

Sara Epifânio junto ao Parlamento húngaro

Sara Epifânio junto ao Parlamento húngaro

Nesse sentido, Sara rumou à Hungria de forma a diminuir a curiosidade acerca daquele país que conhecia de uma forma tão negativa, “quando percebi que tinha a oportunidade de estudar em Budapeste decidi aproveitar”, explica. Sara Epifânio percebeu então que esta experiência lhe permitiu “ter uma ideia do que era a Hungria e de perceber que país era este que era governado por um governo liderado por Orbán”.

Vista de Buda sobre Peste

Vista de Buda sobre Peste

O fenómeno dos extremismos impulsionou o nascimento de movimentos como o Pulse of Europe. O seu surgimento remonta a 2017 na Alemanha. Eduardo Antunes, um dos voluntários em Portugal, conta que o crescimento do nacionalismo no país com o partido AFD (Alternative für Deutschland) motivou um casal de advogados de Frankfurt a criar o movimento, uma vez que consideravam que a UE era um espaço que oferecia vantagens para a população, não sendo estas devidamente passadas ao conhecimento dos cidadãos. Assim juntaram um grupo de amigos e começaram a “sair à rua numa manifestação espontânea pró-europeia, com a característica de ser uma manifestação pró-qualquer coisa e não anti-qualquer coisa”. No mesmo ano, um português, um alemão e um austríaco, os três amigos, fizeram com que a mesma reunião acontecesse em Portugal.

“Em Portugal vivíamos ainda um momento em que éramos considerados a ilha sem movimentos nacionalistas, não tínhamos ainda um partido de expressão com essa natureza”, explica Eduardo Antunes. “Aliás, nós tínhamos medo que ela surgisse e infelizmente ela acabou por surgir agora nesta fase”. O crescimento dos nacionalismos constitui uma das “principais preocupações” para o voluntário do movimento em Portugal. Por sua vez, o voluntário Luís Vicente enfatiza que atualmente existem duas ameaças: o nacionalismo clássico e um novo nacionalismo europeu, que ao contrário do clássico, tem ideias extremamente pró-europeias. 

Desde 2017 que os voluntários reúnem pessoas para falar sobre a União Europeia pelas ruas de Lisboa, que é neste momento o único núcleo em Portugal. Eduardo Antunes e Luís Vicente, tal como outros voluntários, trabalham ao mesmo tempo que pertencem ao Pulse of Europe. O caráter apartidário do movimento é uma característica que o distingue de outros movimentos.
É um movimento "claramente pró-União Europeia", o que não o torna acrítico das políticas que apresenta. Eduardo explica que o Pulse of Europe "gosta de perceber o que corre bem e o que corre mal na União Europeia, mas na lógica de que os cidadãos têm uma função ativa na sociedade". Por um lado, o Pulse of Europe leva “a UE para a rua”, como conta o voluntário, por outro lado, os eurodeputados levam os seus países para a UE. 

Eduardo Antunes e Luís Vicente, juntamente com outros voluntários do Pulse of Europe, em algumas reuniões em Lisboa.

Eduardo Antunes e Luís Vicente, juntamente com outros voluntários do Pulse of Europe, em algumas reuniões em Lisboa.

Relativamente ao nascimento de partidos extremistas na Europa, as opiniões dividem-se claramente entre os eurodeputados de direita e os de esquerda. 

Nuno Melo, do CDS-PP, considera que “todo o extremismo é perigoso”. No Parlamento Europeu, os partidos de extrema-direita e extrema-esquerda são ambos anti-europeístas e “votam em conjunto e no mesmo sentido quando estão em causa questões que têm que ver com pilares fundamentais do nosso projeto comum”. Da mesma forma, tanto os extremismos de direita como os de esquerda preocupam José Manuel Fernandes, eurodeputado do PSD. Os radicalismos “são maus, ainda que em alguns pontos diferentes, quer sejam de direita quer sejam de esquerda. Muitas vezes até se autoalimentam”. 

Do outro lado do espectro político, a extrema-direita constitui uma ameaça ao projeto europeu. Do Partido Comunista Português, Sandra Pereira acredita que a origem para estes movimentos é a falta de resposta dos decisores políticos. "As políticas que são impostas por Bruxelas não dão resposta àquilo que são os problemas das pessoas. Há espaço para o populismo crescer, que muitas vezes é uma consequência destas políticas que não são inclusivas”. O mesmo motivo foi apontado por Marisa Matias do Bloco de Esquerda.

“O descontentamento que as pessoas têm em relação à falta de respostas por parte de quem decide politicamente, vai tornando as pessoas cada vez mais descrentes e desligadas da política democrática porque tem sido muito ingrata. Todas estas questões têm levado a que forças populistas e de extrema-direita tenham conseguido cavalgar nas dificuldades”. Marisa Matias


Apesar dos extremismos políticos serem um tema emergente e que preocupa as várias entidades europeias, esta não é a única preocupação numa Europa a longo prazo. Pondo, por instantes, as motivações partidárias de parte, tanto Marisa Matias como Nuno Melo consideram que o combate às alterações climáticas terá de ser sempre um tema presente na agenda europeia.

"Do meu ponto de vista, é um desafio geracional, o combate às alterações climáticas, que permita garantir as metas necessárias para que o planeta sobreviva e que as próximas gerações tenham condições de vida decentes. É um desafio que nos ultrapassa, quer ao projeto europeu quer como país. Mas creio que é o desafio da nossa geração. Sem um combate real às alterações climáticas para garantir o futuro, tudo o resto quase que parece secundário." Marisa Matias

Objetivos da UE para 2030 em matéria de clima e energia. EUClimateAction

"A União Europeia é o bloco à escala mundial que mais investe na transição ambiental, mais exige às empresas no investimento para que se adaptem a essas exigências ambientais, e está realmente à frente de todo esse esforço. Curiosamente tanto no esforço ambiental, como no esforço social. Cerca de 50% das despesas sociais do planeta são gastas na União Europeia, não são na América, obviamente não são na China, nem na Rússia, nem na Índia. A Europa está à frente em muito." Nuno Melo

No entanto, os desafios da Europa não ficam por aqui. Para além do combate às alterações climáticas, Marisa Matias considera que a probreza, as desigualdades e a precariedade laboral são problemas que estão longe de estarem solucionados.

“O combate às desigualdades e à pobreza é um desafio enorme. Com as crises que temos passado, o que assistimos foi um agravar das desigualdades e não a eliminação. A precariedade está a tornar-se uma espécie de regra para o trabalho, o que faz com que a generalidade das pessoas trabalhe, mas com salários baixos e instáveis. E muita gente trabalha e não consegue sair da pobreza. Isso tem a ver com a precariedade. Isto depois permite-nos lidar com outros desafios, como o envelhecimento da população, questões da migração. Se reconhecermos os direitos laborais, combatemos muitas fontes de desigualdade e discriminação."

Percentagem de trabalhadores em empregos precários por país. Eurostat

Percentagem de trabalhadores em empregos precários por país. Eurostat

O gráfico da Eurostat mostra os dados de 2019 relativos à percentagem de pessoas em empregos precários por país. Portugal aparece no meio da lista, com uma percentagem de pouco mais de 2% de trabalhadores em precariedade laboral.

Defensora de um "trabalho com direitos e valorização salarial", também Sandra Pereira, parceira de Marisa Matias no Grupo da Esquerda do Parlamento Europeu, mostra as suas preocupações com a precariedade laboral. A precariedade dos vínculos laborais, o congelamento das carreiras, as subcontratações e a desregulação dos horários a que se junta os bancos de horas, são problemas que a deputada enuncia no que diz respeito às condições laborais.

"Ficamos com a ideia de que a UE é um problema, enquanto que é uma solução."

José Manuel Fernandes

O Pulse of Europe distingue-se das demais iniciativas por ser apartidário. No entanto, isso não faz com que as suas preocupações sejam menos relevantes das dos eurodeputados. Em conversa, o Eduardo e o Luís falaram da preocupação que o movimento tem em relação à falta de conhecimento dos cidadãos sobre o projeto europeu. "Há muita luta da parte do PoE (para) as pessoas entenderem que muitas coisas que têm na sua vida resultam da União Europeia." O que os voluntários tentam fazer é, chegar às pessoas, e explicar-lhes em que consiste o projeto europeu, indo sempre à raiz de como tudo começou. O PoE tenta também explicar as quatro liberdades. "A livre circulação de pessoas, que é algo que muitas vezes as pessoas não têm consideração que surge do projeto europeu, o facto delas puderem trabalhar e deslocar-se também no espaço Schengen, explicando também o que é o espaço Schengen, a possibilidade de trabalhar com o reconhecimento das suas qualificações noutros países europeus, portanto esta lógica de mercado único que é fundamental e é a base da União Europeia mas que falha na mensagem, no conhecimento que as pessoas têm sobre de onde é que vem estes seus direitos.”

"Façam da Europa aquilo que desejam que ela seja! Não associem a União Europeia apenas a um conjunto de políticas, só porque são as que têm sido seguidas."

Luís Vicente, PoE


QUEM SOMOS?



Agradecimentos:
Eduardo e Abílio Freitas e colaboradores da Luipex
Albano Fernandes e Pedro Neves da AMF Safety Shoes
Eurodeputados José Manuel Fernandes, Marisa Matias, Nuno Melo e Sandra Pereira
Professor Paulo Mourão
Sara Epifânio
Eduardo Antunes e Luís Vicente do Pulse of Europe